19 março 2017

 
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Este artigo apresenta uma análise lexical das expressões idiomáticas encontradas na mídia impressa popular, no período de agosto de 2013 a dezembro de 20141, com o objetivo de mostrar a produtividade lexical no discurso jornalístico, mais especificamente, das expressões idiomáticas. Analisamos a maneira como essas unidades complexas podem contribuir para o desenvolvimento da ampliação lexical qualitativa dos alunos do Ensino Fundamental e Médio, considerando que tais unidades fazem parte do acervo lexical da língua portuguesa e que, portanto, devem ser apresentadas no ensino de língua materna. Com o objetivo de mostrar a produtividade lexical da expressões idiomáticas (EIs) no discurso jornalístico, analisamos a maneira como essas unidades complexas podem contribuir para o desenvolvimento da ampliação lexical qualitativa dos alunos do Ensino Fundamental e Médio, considerando que tais unidades fazem parte do acervo lexical da língua portuguesa e que, portanto, devem ser apresentadas no ensino de língua materna.
No entanto, cabe destacar, ainda, que a ocorrência das expressões idiomáticas é mais frequente nas manchetes das notícias (55,61%), pelo fato de as expressões idiomáticas, enquanto estruturas da linguagem popular, serem responsáveis pela ênfase que se dá ao fato noticiado. Por intermédio das manchetes, é possível perceber a que fatos e aspectos o jornal dá importância, de acordo com o perfil e a realidade do seu público-alvo. É característica do jornal Super dar um caráter pessoal à reportagem. Através da personalização, é possível contar a vida de alguém ou do povo, tornando a notícia próxima ao leitor. O título já aponta para a singularização, considerando que os jornalistas precisam garantir nas redações que a imprensa popular faça jornalismo e se democratize.
                  Os dados mostram que a maior parte das EIs apresentadas no nosso corpus podem ser consideradas unidades semi-fixas, ou seja, das 187 expressões analisadas, 75,93% (142) dessas EIs sofreram algum tipo de variação lexical ou de flexão verbal em sua estrutura. Ora, se o maior número das EIs encontradas no corpus são consideradas semi-fixas, o grau de fixidez dessas unidades tende a ser menor. Pelo fato de as expressões idiomáticas serem constituídas por vários elementos lexicais, elas ensejam grandes possibilidades de variação, o que relativiza a sua invariabilidade. Porém, há que se considerar que alguns casos permitem adaptações sintáticas, embora sejam variações bastante limitadas.
Quadro 01- Produtividade no nível sintático
Soltinha na pista
Desde que terminou com o futuro presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, CAROL MUNIZ ficou soltinha na pista. Após posar para o Paparazzo então, ela tem feito ainda mais sucesso. (Jornal Super Notícia. Belo Horizonte, ano 13, 28 de novembro de 2014, p.16. Caderno de Variedades).
Estar na pista 1 Gír. Estar disponível para ficar (12) com alguém ou à procura de romance, ger. sem compromisso. Disponível em < http://www.aulete.com.br/pista#ixzz3NKWEA75Q>Acesso em 26 de dez.2014.

Na composição das EIs, um item lexical pode ser substituído por outro, desde que o valor semântico seja semelhante. Trata-se da variação por permuta verbal. No nosso corpus, encontramos apenas 2 (dois) casos de permuta verbal para a unidade sair do armário, conforme exibe o quadro abaixo:
Quadro 02- Variações das Expressões idiomáticas- Permuta verbal

TIPO DE VARIAÇÃO
EXEMPLOS

PERMUTA VERBAL
1. Arrombou o armário
Wentworth Miller, astro da série norte-americana “Prison Break”, assumiu ser gay em uma carta enviada para a organização do Festival de Cinema Internacional de São Petersburgo. (Jornal Super Notícia, 18/11/2014)
2. Tirar o bofe do armário (Expressão livre)-Será que ela quis tirar o bofe do armário à força? (Jornal Super Notícia,18/11/2014).

         Observamos que, embora o verbo sair tenha sido substituído pelos verbos tirar e arrombar, conforme atestam os exemplos do quadro 3, as expressões sair do armário arrombar o armário mantêm o mesmo sentido de se libertar, quando o sujeito assume a homossexualidade. O dicionário eletrônico Caldas Aulete (2014) registra a expressão sair do armário como o ato de assumir a própria homossexualidade.
         Tal como mostramos, a substituição da expressão sair do armário por novos itens lexicais-tirar o bofe do armário e arrombar o armário ganha maior expressividade, visto que tirar e arrombar são verbos que nos dão a ideia de ação concretizada pela força.
Nos casos apresentados acima, a ideia de força está subjacente ao ato de se libertar no processo de confirmação da homossexualidade. Na sua versão eletrônica, Caldas Aulete (2014) dá ao termo arrombar, por exemplo, o significado de romper, de usar a força na ação verbal. Verifica-se, então, que as forma arrombar o armário é mais enfática e mais expressiva do que sair do armário, embora o significado permaneça inalterado.
       No caso da expressão tirar o bofe do armário à força, consideramos que, embora certas combinações de palavras, frente a outras combinações, que são totalmente possíveis de ocorrerem, ainda há controvérsias, no tocante à classificação de algumas colocações, caso da expressão tirar o bofe do armário à força, diante da complexidade em fazer distinção entre tais estruturas. Dadas as controvérsias inerentes à classificação dessas construções, optamos por tratá-las como expressões livres.
       Outro tipo de modificação parcial na estruturação dos constituintes lexicais é a variação pela forma negativa com é apresentada a EI. Em geral, esse tipo de variação acontece para melhor adequação da unidade ao discurso. No nosso corpus, das 187 expressões examinadas, foram encontrados apenas dois casos de variação nas formas de negação.
Quadro 03- Variações das Expressões idiomáticas nas diferentes formas de negação

TIPO DE VARIAÇÃO
EXEMPLOS

FORMA DE NEGAÇÃO
1. Fernandinha não dá mole (dar mole/não dar mole)
(Jornal Super Notícia. Belo Horizonte, 10 de outubro de 2014,
página 22)
2. Não larga o osso! (largar o osso/não largar o osso)
Até agora, o ilustre presidente da FIVB não veio a público para se explicar. Está sumido! Esse osso deve ser bom mesmo, pois esse pessoal não o larga de jeito nenhum! (Jornal Super Notícia. Belo Horizonte,10 de outubro de 2014.página 23).

         Com a inserção do advérbio de negação, o papel semântico-sintático1 liga-se ao núcleo verbal. Na classificação do advérbio de negação não, por exemplo, ele se pauta pelos valores léxicos das unidades que o constituem. O valor de existência que se atribui ao estado das coisas é designado pela oração negada. Nos exemplos não dá mole/não larga o osso, temos uma forma de negação da UF matriz (dar mole/largar o osso). Na seção seguinte, damos continuidade à discussão, considerando o acréscimo de itens lexicais às unidades.
        Atentando-se para as características das unidades variáveis orientadas nos parágrafos anteriores, examinamos a possibilidade de inserção de um novo item na estrutura das EIs. Ao analisar os casos de inserção de um item lexical no corpus, observou-se que o número de ocorrências desse tipo de variação foi um número significativamente menor, embora tal variação não possa ser ignorada, pois ilustra outros tipos de variação dessas UFs.
       Os dados mostram que foram poucas as unidades 3% (3) que tiveram o acréscimo de um item lexical em sua estrutura. Por outro lado, 97% (184) que não tiveram o acréscimo de um item lexical, foram as unidades que mantiveram, consequentemente, sua carga metafórica. No quadro seguinte, temos 02 (dois) exemplos desse tipo de variação.
Quadro 04-Variações das Expressões idiomáticas- Inserção de um item lexical

TIPO DE VARIAÇÃO
EXEMPLOS

INSERÇÃO DE UM ITEM LEXICAL
1. Técnico frisa parceria com a torcida e espera colher bons frutos na sequência.(Jornal Super Notícia,2 de novembro de 2014, p.17).
2. A população terá que arregaçar as próprias mangas. (Jornal Super Notícia. Belo Horizonte, 1 de julho de 2014,p.17).
            Na imprensa popular, um fato terá maior probabilidade de ser noticiado se possuir capacidade de entretenimento, for próximo culturalmente do leitor e puder ser simplificado, mas também se puder ser narrado dramaticamente. Dessa maneira, a linguagem empregada nas notícias do Super se utiliza de vários recursos para dialogar com o leitor e tornar o fato noticiado mais enfático.
Em gêneros de tipologia narrativa, a adjetivação funciona como um recurso expressivo. Os adjetivos explicadores destacam e acentuam uma característica inerente do objeto nomeado ou denotado, conforme vimos na seção 2.8 do capítulo 2. Nesse caso, o adjetivo pertence a um inventário aberto, tendo entre suas funções, a de delimitador explicador. Na expressão colher bons frutos, por sua vez, a inserção do adjetivo bons na UF, teve o mesmo efeito e a mesma função de delimitador explicador do primeiro exemplo.
        As palavras são empregadas nas frases, justificando o exame de suas diferentes possibilidades combinatórias nas cadeias frasais. Na expressão arregaçar as próprias mangas, como exemplo, a inserção do pronome próprias denota identidade ao substantivo mangas. Ainda em Bechara (1999), observamos que a função dos pronomes mesmo e próprio tem valor demonstrativo, ao se referirem a seres e ideias já expressas anteriormente. Assim, inserir modificadores na estrutura da expressão pode retirar ou alterar sua carga metafórica, alterando seu sentido. Entretanto, nem todas a UFs admitem transformações.
      O fenômeno da coocorrência foi observado por Palmer (1979), relacionando-o a “frases idiomáticas”. Ele ainda destaca as inúmeras restrições gramaticais e sintáticas sofridas por essas frases. Em relação às expressões idiomáticas coletadas no nosso corpus, observamos que o número de EIs que admitem modificações em suas estrutura é menor do que aquelas
Quadro 05- Variações das Expressões idiomáticas- Restrição sintática

TIPO DE VARIAÇÃO
EXEMPLOS

RESTRIÇÃO SINTÁTICA
1.Cuca quebra a cabeça. (Jornal Super Notícia, Belo Horizonte, 13 agosto 2013, p.26).
2. Aécio está dando um banho na presidente Dilma em Minas, segundo pesquisa Sensus que ouviu 1.500 mineiros entre os dias 25 e 29 de julho.(Jornal Super Notícia. Belo Horizonte,11 de set. de 2013, p.23).

           Perder a cabeça é uma EI que corresponde a cometer loucuras, ser imprudente. Enquanto dar um banho significa realizar determinada ação em abundância. Trata-se de unidades que apresentam restrições sintáticas. A forma verbal comporta-se tipicamente como um item normal da língua, sem restrições gramaticais, o mesmo não ocorre com o item nominal: (perdeu a cabeça, vai perder a cabeça/deu um banho, vai dar um banho). Observamos ainda, a possibilidade de preenchimento do sujeito: Cuca perdeu a cabeça, nós perdemos a cabeça, ele vai perder a cabeça. Entretanto, não podemos ter: Perdeu as cabeças, Perdemos as cabeças, ele vai perder as cabeças.
          Da mesma forma em que ocorre o preenchimento de sujeito em: Aécio está dando um banho, nós demos um banho, ele vai dar um banho e, não, Aécio deu uns banhos, demos uns banhos. Ainda que haja a possibilidade de inserção de um sujeito, os itens nominais cabeças/banhos não são adequados para essas expressões no sentido idiomático. Como restrição sintática, observamos a impossibilidade de apassivamento: “a cabeça de cuca foi perdida”. Considerando o sentido idiomático da expressão, tal interpretação é impossível.


Referências

1Este artigo tem como base MENDES (2015), dissertação de mestrado defendida e aprovada na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), sob orientação da Profa. Dra. Evelyne Jeanne Andrée Madeleine Dogliani.